segunda-feira, 24 de abril de 2006

“ROSAS VERMELHAS” (antes da Revolução)

“Em Maio de 1963 eu estava na cadeia. Dormia – como direi – acordado sobre cada minuto. Tinha aprendido o irremediável. Alguma coisa, dentro de mim, se despedaçara para sempre (para sempre? Que quer dizer para sempre?). Era inútil chamar. Tinha aprendido, fisicamente, a solidão. Embora na cela do lado, alguém, batendo com os dedos na parede, me dissesse:
– Coragem!
Eu estava, pela primeira vez, fisicamente só, dentro do meu sono povoado por esse grito que estalava por vezes através da minha cabeça (onde essa voz que mandava embora os fantasmas?)
E era terrível essa manhã sem amanhã, essa realidade branca e gelada, toda feita de paredes, grades, perguntas, gritos. Mesmo que na cela do lado, alguém, batendo com os dedos na parede, me dissesse:
– Bom dia!
Era terrível acordar nessa estreita paisagem com sete passos de comprimento por sete de largura, tão hostil, tão doloroso como as regiões dos pesadelos. Porque acordar era ter a certeza de que a realidade não desmentiria o pesadelo.
Mesmo que os meus dedos batendo na parede transmitissem notícias de um homem que podia responder:
– Bom dia!
De cabeça erguida, era terrível acordar no mês de Maio, com a certeza de que no dia doze a minha mãe não entraria pelo quarto, deixando-me na fronte um beijo, e rosas vermelhas sobre os meus vinte e sete anos.
Talvez seja preciso renunciar à felicidade para conquistar a felicidade (...)”.
Rosas Vermelhas – Manuel Alegre
Celebraremos, amanhã (cantando a Grândola), a Revolução.

1 comentário:

Anónimo disse...

Viva o 25 de Abril !